O virologista Bergmann Ribeiro, da Universidade de Brasília (UnB), destacou ontem que não há necessidade de pânico por conta do primeiro caso de gripe aviária registado no Distrito Federal. Na segunda-feira, exames feitos em um irerê (espécie de marreco) encontrado morto no Zoológico de Brasília deram positivo para o vírus H5N1, causador da enfermidade. Aos jornalistas Carlos Alexandre e Mila Ferreira, durante o CB.Saúde — parceria do Correio Braziliense com a TV Brasília —, ele enfatizou que a doença é mais perigosa para as aves, com uma letalidade de até 90% entre elas. Há três semanas, foi registrado o primeiro caso em uma granja comercial no país, em Montenegro (RS). Outras três supeitas foram descartadas.
Os brasilienses devem se preocupar com o primeiro caso confirmado de gripe aviária no DF?
Não há necessidade de pânico neste momento. A gripe aviária afeta, basicamente, as aves. Pode infectar outros mamíferos, como o próprio ser humano, mas é uma doença de ave. A infecção no ser humano não é comum. É preciso estar em contato com as aves por muito tempo para que o vírus possa infectar. Mesmo se alimentando de galinhas e ovos, o vírus é facilmente inativado pelo calor. Ele não é como a covid-19, que pode causar uma pandemia.
Qual o contexto da infecção de gripe aviária na capital?
Em Brasília, a contaminação atingiu uma ave migratória, um tipo de pato, que vem para cá para fugir do frio. Ela pode entrar em contato com outros animais e transmitir o vírus, que infecta mais de 500 espécies de aves. Em muitos casos, ele (o vírus) não faz nada. Mas em outros, como as galinhas, por exemplo, a letalidade é de 90%. É fácil reconhecer uma infecção por gripe aviária. No caso de uma granja, se o vírus entrar ali, vai matar a maioria dos animais.
Como funciona a transmissão para outras espécies de animais?
Em 2023, em Santa Catarina, morreram quase mil leões-marinhos de gripe aviária, pois essa espécie é suscetível. A gripe aviária já foi detectada em outras 50 espécies de mamíferos. No gato, ela causa uma doença séria, com uma taxa de mortalidade acima de 50%. No leão-marinho, é de 70% a 90%. Nos seres humanos, apesar do número reduzido de casos, um estudo na China mostra que a taxa de mortalidade seria de 50%.
De que forma pode ser realizada uma abordagem preventiva?
A principal abordagem preventiva é a vigilância. Existem a vigilância passiva e a vigilância ativa. A passiva é quando morre um bicho e você verifica o que aconteceu com ele. Na ativa, você coleta as aves, mesmo aparentemente saudáveis, e verifica se elas estão infectadas ou não. Sem a vigilância, não há como saber se há circulação do vírus. As pessoas também precisam usar material de proteção e não entrar em contato com as aves, além de monitorar outros animais que podem ter contato com elas.
Quais são as chances de mutação do vírus H5N1?
As chances de um vírus circular para outro organismo dependem da possibilidade de ele se replicar e se reproduzir. Quanto mais vírus se reproduzindo, maior é a chance de ele sofrer mutação e passar para outro animal. Quanto mais as infecções das aves estiverem contidas, menor vai ser a chance de ele mutar e virar um vírus capaz de infectar seres humanos. Por isso, tem que ter vigilância e controle do espalhamento desse vírus, porque a possibilidade existe.
Qual é a possibilidade de transmissão por meio do consumo de aves e ovos?
Muito pouco provável, porque esse vírus é muito sensível ao calor. Não tem perigo comer ovo cozido, galinha ensopada, filé de frango, porque o vírus vai ser inativado. Até porque essa galinha não seria abatida. Ela estaria morta se estivesse infectada com o vírus da gripe aviária. E, mesmo que uma galinha morra infectada e vá para o abate, ao preparar essa galinha frita ou ensopada, o vírus será inativado.
Há perigo nas vendas de aves nas feiras?
Esse é um grande problema, porque o movimento de animais vai gerar a possibilidade de o vírus se espalhar. Se ocorrer um foco de infecção numa granja e a pessoa for vender essa galinha na feira, tendo outros animais ali, a possibilidade de espalhamento da infecção é muito grande. Porém, as galinhas são altamente suscetíveis e, se começar a morrer galinha na feira, será necessário parar esse comércio, pois pode espalhar a infecção.
Um avicultor, que teve contato com as galinhas infectadas, também pode ser um transmissor?
Ele ou qualquer utensílio que seja utilizado para tratar as galinhas podem transmitir. A galinha espirra e pode soltar secreções, como nós. Mas só vai ser transmitido para aquele organismo altamente suscetível. Por isso, os carros precisam ser desinfetados. Eles podem, passivamente, levar o vírus nas rodas, por exemplo.
Quanto tempo o Zoo precisará ficar fechado para que seja feita essa vigilância?
É preciso esperar duas ou três semanas. Se não aparecer nenhum outro caso, após a vigilância, acredito que não teria problema. Esse vírus é muito patogênico. Caso apareça outro animal infectado, ele vai mostrar. Fazendo a vigilância, é possível saber se o vírus está circulando ou não.
A vacina contra influenza protege contra a gripe aviária?
Não, ela protege contra a gripe que está circulando no país e no mundo. Normalmente, existe um sistema de vigilância de gripe no mundo inteiro. Quando tem inverno, as pessoas que estão com gripe são avaliadas e é tipado o vírus que está circulando. A partir daí, ocorre a formação de uma vacina para esses vírus que estão circulando e ela pode ser usada por alguns anos. Como esse sistema ocorre todo ano, é possível renovar as vacinas de tempos em tempos, conforme o vírus que está circulando. Caso a gripe aviária surja, de repente, em seres humanos, a resposta vai ser muito mais rápida do que a resposta ao coronavírus, que era um vírus que não causava uma doença grave. Mas a influenza pode causar doença grave. Então, já estamos bem preparados para combater, talvez, uma nova pandemia.
O que devem fazer as pessoas que cuidam de galinhas em chácaras?
Não há muito o que fazer agora. As pessoas precisam tentar criar a galinha da forma mais limpa possível, não deixar outros animais chegarem perto do galinheiro. Como não está presente nos seres humanos, a probabilidade é muito pequena de você conseguir infectar as galinhas dessas pequenas chácaras. Se espalhar a infecção, será possível ver essas galinhas morrendo. Aí vai ter um problema de eliminar as galinhas. Mas não dá para ficar desesperado porque uma galinha está gripada. Não se sabe o que está acontecendo em volta ainda. Não é momento para pânico, porque foi só um caso, no zoológico. Nem em granja foi.
Por Por Brasília
Fonte Correio Braziliense
Foto: Bruna Gaston CB/DA Press